quinta-feira, 24 de outubro de 2019

O verbo que se fez carne, que se fez verbo

Nesta crônica natalícia, pelos meus 62 anos, alguns verbos conjuguei, todos eles amparados no verbo viver, o mais bonito, o mais desejado. Confiram.

“No princípio era o Verbo, e o Verbo estava com Deus, e o Verbo era Deus”. (João 1:1); “E o Verbo se fez carne, e habitou entre nós [...]. (João 1:14) E sem maiores delongas, por força ilustrativa desta crônica, digamos que tudo aconteceu exatamente como está nas Escrituras Sagradas, sem levarmos em conta eventual simbologia.

A continuar a célere marcha do tempo, já no ano de 1957 da Era Cristã, ele veio ao mundo: um mundo conturbado, vítima de duas grandes guerras mundiais, incontáveis catástrofes naturais e outras tantas provocadas pelo homem — esse animal (ir)racional — enfim, um mundo bem diferente: final dos tempos para muitos!

Vinte anos depois, em 1977 — adulto já — nem percebeu estar a viver a conjugação do verbo: um verbo neológico, raramente usado, o verbo vintar, certamente o mais belo deles, não pela eufonia, mas por dizer respeito à fase mais bonita e viçosa da existência humana na qual sonhos e incertezas andam pari passu. Ele, então, passou a ser um vintenário sonhador e poeta.

Em 1987, ele trintou. Tinha, certamente, plena consciência do que era ser um vivente trintenário. Na ocasião, tentou fazer um poema para homenagear a si mesmo. Mas esbarrou na tentativa. Ou melhor, ainda escreveu uma mensagem rememorativa dizendo-se feliz por viver intensamente a terceira dezena existencial.

À luz, no entanto, das constatações científicas, principalmente aprendidas nas aulas de Biologia, recordou que o envelhecimento dos tecidos e a diminuição gradativa das forças musculares seriam doravante inevitáveis e visíveis. Nada assustador: ele se sentia mais maduro, mais sereno, mais produtivo e jovem de espírito, não sentindo — ainda — o peso cumulativo dos outubros vividos.

Ano de 1997, mês de outubro, dia 24. Ele é pai de uma linda menina (êta corujice explícita!) de um ano e meio. Fez algumas coisas certas e outras tantas que não frutificaram. Bem mais maduro, segue poeta sonhador, embora “as pedras do caminho” o tenham tornado mais crítico, mais consciente, por isso mesmo a vibrar mais com vitórias alcançadas e das intempéries a retirar lições.

E o Verbo? Lembra-se do Verbo que se fez carne? Pois bem! As dezenas perfeitas, isto é, os numerais arábicos cardinais a denotar contagem natalícia, que se fizeram ao longo dos tempos os verbos vintar e trintar, continuam sua conjugação atemporal. E assim, é a carne que se vai transformando em verbos e, gradativamente, habitando em mim: quarentei!

Salvador (BA), 24 de outubro de 1997.

Em tempo: Depois do verbo quarentar, há 22 anos, quando esta crônica foi escrita, cinquentei, sessentei, na esperança de que outras conjugações verbais hão de vir. E que venha o próximo verbo que pretendo conjugá-lo na primeira pessoa do Pretérito Perfeito: setentei. Hoje, ainda conjugado no Futuro do Presente: setentarei. Se Deus assim desejar! E que seja esse o desejo dEle.

Santa Maria da Vitória (BA), 24 de outubro de 2019.

Quem sou

Crônica da luz intermitente

Aquele teria que ser um dia muito especial, bem fora da minha rotina. Foi 1º de maio de 2024, algo bem recente, Dia do Trabalhador e dia dos...